A PRIMEIRA EDUCAÇÃO
É no lar que o ser humano deveria ter sua primeira educação sexual. De acordo com a sexóloga Marta Suplicy,
"Uma criança falante e curiosa pode começar a mostrar interesse pelo sexo aos 2-3 anos, mesmo sem o uso da palavra. A maioria o fará com 4-5 anos de idade" (1983, p. 36).
Nesta fase o que a criança quer saber é muito pouco, não é preciso explicar detalhes, mas também não minta, não brigue, não desconverse, explique o básico na linguagem que ela puder entender.
Muitos pais acreditam que as crianças não devem fazer perguntas sobre sexo por acreditar que não possuem idade suficiente para entender, considerando, portanto, um absurdo qualquer menção a este assunto. Muitos adultos se escondem, sentem vergonha e a causa pode estar numa infância mal orientada.
No texto de Freud “Esclarecimento sexual das crianças” em resposta a uma carta de Dr. M. Fürst, ele afirma que as crianças devem receber educação sexual assim que demonstrem algum interesse pela questão (KUPFER, p. 46, 1997).
A criança que tem idade para perguntar também tem idade para ouvir. Os pais nunca devem dar respostas imaginárias e irreais como, por exemplo: se a criança perguntar como nasceu o pai responder que foi a cegonha que trouxe, ao invés de falar a verdade na linguagem adequada para cada idade.
Quando a criança descobre que os pais estão mentindo ela se sente enganada como afirma Suplicy, “No momento que seu filho descobrir que você o engana você não será mais um pai ou mãe perguntável. Você perde a credibilidade, mas seu filho continua curioso e perguntará aos colegas” (1983, p. 36).
Não adianta falar sobre espermatozóides e óvulos com uma criança de 2 ou 3 anos, nesta idade muita explicação pode confundir e o tempo de concentração é muito pequeno, portanto os pais devem ser breves, seguros e sobretudo falar com naturalidade.
As primeiras perguntas feitas pelas crianças geralmente são: porque o pipi do papai maior que o meu? Porque ele tem esses pelinhos e eu não? Onde está o pipi da mamãe? Por onde saem os bebês? Isto acontece porque nas primeiras perguntas infantis a criança faz uma constatação do que observa, segundo Suplicy. A mesma autora ainda observa que conforme a criança vai crescendo as perguntas vão se sofisticando, e ao redor dos quatro-cinco anos ela já quer saber como o bebê sai da barriga da mãe. E, provavelmente a pergunta seguinte será como entrou” (1983, p. 36).
Estas perguntas devem ser respondidas da forma mais natural possível. Se os pais a repreendem, a criança nunca mais lhes perguntará e continuará tão curiosa quanto antes, afinal está numa fase de descobertas. Sem a ajuda deles ela poderá interpretar o sexo de forma errada, acreditando, por exemplo, que seu pênis tem algum problema por ser menor que o do pai, que o pênis da mamãe ou da irmã foi cortado.
Muitos pais não sabem como responder a este interrogatório. Uma das perguntas mais difíceis dos pais responderem é “como o bebê entrou na barriga da mamãe?” O livro Mamãe botou um ovo!, de Babette Colle, apresenta uma alternativa de resposta: “A mamãe tem ovos dentro da barriga. O papai tem sementes nos saquinhos que ficam fora do seu corpo. O papai tem um tubo. As sementes que estão nos saquinhos saem por ali. O papai encaixa na mamãe e o tubo entra na barriga dela por um pequeno buraco. Então as sementes nadam lá dentro com a ajuda de seus rabinhos até o ovo. Quando os dois se juntam formam o bebê”.
Explicações como esta já podem ser dadas a crianças de 4 a 6 anos. Antes disso é difícil compreender e depois disso já é necessário uma linguagem mais próxima do real para evitar distorções, mesmo porque eles já ouvem comentários dos colegas e já estão mais ligados em algumas cenas de novelas ou filmes.
Surgindo o interesse, não antes disso para não precipitar sua maturidade, os pais poderão utilizar um livro de sexo para crianças como recurso, utilizando o nome correto dos órgãos genitais como pênis, vagina e não pinto, cocota, piriquita e outras expressões.
Da mesma forma e sempre, as respostas devem ser verdadeiras e claras. Alguns pais acreditam que a criança ficará assustada com palavras como pênis, vagina, espermatozóide. A partir de 4 anos já é possível falar sobre o parto natural ou cesárea, sobre a relação do papai e da mamãe, lembrando-se sempre: na linguagem adequada e nada de assombros.
Citaremos abaixo alguns exemplos de diálogo com crianças, extraídas do livro “Falando com seu filho sobre sexo: perguntas e respostas para crianças do nascimento até a puberdade”.
Até os três anos:
_ O que é isto?
_ É um pênis.
_ Para que serve?
_ É com ele que os meninos fazem xixi.
_ Olhe, ele fica duro.
_ Certo! Todos os pênis fazem isto de vez em quando.
_ Papai tem um pênis também?
_ Tem; todos os homens e meninos têm um.
_ Ele fica duro também?
_ Algumas vezes. Ele se sente bem assim.
_ O que é isto?
_ Chama-se vulva.
_ Por que é toda cabeluda?
_ Todas as mulheres crescidas têm cabelos aí.
_ Porque eu não tenho?
_ Para meninas: É porque você ainda não cresceu. Quando Você crescer, terá cabelos aí, igual à mamãe.
_ Para meninos: Você terá cabelos em volta do seu pênis quando crescer.
_ O que é esse saquinho? Tem bolinhas.
_ É um escroto, e os dois caroços parecidos com bolinhas chama-se testículos.
Cinco e seis anos:
_ O que quer dizer ”foder”?
_ Significa ter relação sexual, quando o homem introduz o pênis na vagina de uma mulher. “Foda” é uma palavra da gíria que não deve ser usada em público. Não é educado e muitas pessoas consideram esta uma palavra muito feia mesmo quando não é dita em público. Portanto quando você estiver com outras pessoas nunca diga “foder”, não importando como os outros façam.
_ O que é boceta?
_ Boceta é o nome da vagina na gíria. Há outras palavras para vagina que são tão grosseiras quanto esta. Sem dúvida eu não gostaria de escutar alguém chamar uma vagina por este nome, embora algumas pessoas usem esta palavra quando estão a sós, sem que estejam xingando ou ofendendo alguém. Nunca use uma gíria como esta em público.
_ O que quer dizer “puta”?
_ Puta é o nome usado para uma prostituta na gíria. É uma pessoa que tem relações sexuais por dinheiro e não por amor.
É muito comum a professora ouvir risadinhas quando, numa aula de ciências, são mostradas figuras dos órgãos genitais no estudo do corpo humano e o aparelho urinário. Observamos espantos, murmúrios, indignações. Isto acontece, muitas vezes, por falta de orientação dos pais em casa. Muitas meninas só ficam sabendo que vão menstruar quando conversam com outras colegas que já tiveram esta experiência. Muitas sentem vergonha dos seios que começam a crescer usando como alternativa uma camiseta por baixo da farda ao invés de pedir um sutiã à mãe, e esta, por sua vez, não percebe o constrangimento da filha. Tudo isso mexe com a cabeça do adolescente que além de sofrer todas estas transformações no corpo ainda não contam com o apoio e orientação adequada dos pais.
Se uma criança não tem desde cedo um esclarecimento sobre assuntos ligados ao sexo, não compartilha seus medos e ansiedade com seus pais, se os pais não lhe dão apoio nas suas descobertas, certamente ela será um adolescente carregado de dúvidas buscando em revistas e conversas com amigos o entendimento deste processo e provavelmente um adulto com complexos, culpas e preconceitos, como observa Fagundes: “A sexualidade infantil estabelece as bases para a sexualidade na adolescência e para a sexualidade na vida adulta”.
CONVERSANDO COM ADOLESCENTES
Para chegarmos à adolescência recorreremos à psicanálise para ratificar a afirmação de Fagundes feita no parágrafo anterior, monstrando as fases do desenvolvimento sexual infantil:
Fase oral ou fase da libido oral, ou hedonismo bucal – a criança dos 0 aos 2 anos, através da estimulação da zona oral (sucção, mastigação, satisfação da fome) sente sensações agradáveis de prazer. Nesta fase tudo que vê quer levar à boca.
Fase anal ou fase da libido ou hedonismo anal – nesta fase a criança entre 2 e 3 anos sente prazer em poder controlar parte de seu corpo retendo ou liberando as fezes, começa então a controlar suas vontades e tomar decisões. Sente prazer em brincar com massas de modelar, argilas, barro.
Fase fálica ou fase genital, ou fase da libido ou hedonismo genital– quando começa a interessar-se pelo corpo e manipular seus órgãos genitais. É nesta fase que se inicia o complexo edipiano. No complexo de Édipo o menino sente um amor intenso pela mãe, identificando-se com o pai, sente desejo em ocupar seu lugar sentindo então raiva, medo e culpa. Imagina então que o pai pode cortar seu pênis (complexo de castração). A menina também vive este complexo, mas neste caso sente inveja do pênis. Para a psicanálise o complexo de Édipo é um período fundamental na estruturação da personalidade e a base da identidade do indivíduo.
Inicia então um período de latência que vai até a puberdade e caracteriza-se por uma diminuição das atividades sexuais. A criança entre 6 e 10 anos tem sua sexualidade parte reprimida e parte sublimada, deslocando a energia para atividades e aprendizagens intelectuais e sociais.
Fase genital – é a chegada da puberdade, da adolescência no qual o complexo de Édipo reaparece, porém mais perigoso já que o desejo incestuoso pelo pai/mãe agora pode ser realizado com o surgimento da sexualidade genital. Mas paralelo a isto o superego é organizado e surge como uma barreira ao incesto reprimindo os pensamentos perigosos e censurando o ego que é responsável pelo controle dos instintos. Ocorre então o deslocamento das fantasias de dentro para fora da família, o que gera muita ansiedade e culpa. Juntamente a este deslocamento surge o processo de desligamento da autoridade dos pais.
Segundo Becker, esta necessidade de separação levaria à rejeição e hostilidade aos pais, apresentando comportamentos e atitudes diferentes das dos genitores para diferenciar-se da família. Passa então a buscar uma pessoa acessível para satisfazer seus impulsos, que será ele mesmo. Afirma ainda que a masturbação é importante não só para descarga dos impulsos, mas para que ele tenha contato com o próprio corpo preparando-o para as relações sexuais.
Muitos jovens passam por conflitos e crises e se apresentam com comportamentos rebeldes e hostis. É difícil para os pais entenderem esta fase de transição, pois a rebeldia os machuca. Até então tinha seu filho sob sua proteção, em baixo de seus olhos, obedecendo-os e lhes dando satisfações sobre o que ocorria na escola, com os colegas etc. Agora têm em sua casa um estranho que quase não pára em casa, e quando não está na rua está pendurado ao telefone ou trancado no quarto ouvindo o som nas alturas. Já não quer compartilhar momentos em família porque esta lhe parece careta.
Todo este processo está ligado à sua sexualidade, ao desejo de mostrar-se independente e, não sabendo lidar com estas mudanças, muitos acabam tendo um baixo rendimento escolar.
Podemos encontrar adolescentes e adultos perturbados, frustrados, medrosos. O medo está no momento do desempenho sexual e suas dúvidas muitas vezes ligadas ao uso correto dos métodos anticoncepcionais e doenças sexualmente transmissíveis.
Para muitos adolescentes, hoje, quem é virgem é careta. Querem aproveitar a vida e ao mesmo tempo receiam contrair a AIDS. Muitas vezes a empolgação do momento, o calor da paixão, os faz esquecer das conseqüências e do ditado que diz: quem vê cara não vê aids. Alguns, sequer, possuem conhecimento das DST (doenças sexualmente transmissíveis) e como são transmitidas.
“Ao contrário do que muita gente pensa, as DST são doenças graves que podem causar disfunções sexuais, esterilidade, aborto, nascimento de bebês prematuros com problemas de saúde, deficiência física ou mental, alguns tipos de câncer e até a morte. Uma pessoa com DST também tem mais chance de pegar outras DST, inclusive a aids (http://www.aids.gov.br/final/prevencao/dst.htm).
Abaixo listamos algumas doenças retiras do site: http://www.dst.com.br/
Cancro Duro (Sífilis), Cancro Mole, Candidíase, Herpes Simples Genital, Gonorréia, Condiloma acuminado/HPV, Linfogranuloma Venéreo, Granuloma Inguinal, Pediculose do púbis, Hepatite B, AIDS, Infecção por clamídia, Infecção por trichomonas, Infecção por ureaplasma, Infecção por gardnerella.
Por todos estes problemas os pais sabem que devem conversar com os filhos, mas não sabem como fazê-lo. De um lado estão os adolescentes que sentem vergonha, não querem que entrem na sua intimidade, preferem conversar com amigos trocando experiências obtendo muitas vezes informações distorcidas e errôneas sobre a relação sexual. Do outro lado estão os pais angustiados, com medo da aids, de uma gravidez indesejada e que querem de uma hora para outra ser amigo ou orientador.
O que os pais devem saber é que ninguém abre seu mundo de repente. Este é um processo de confiança e ajuda que deve ser iniciado na infância e acompanhado sempre com amor, compreensão, paciência, cautela e sem dúvida boas informações.
Se os pais sempre evitaram ter estas conversas desde a infância, poderá encontrar grande resistência para um diálogo quando chegar na adolescência, mas nunca devem desistir. É necessário aproveitar as oportunidades que surgem naturalmente para iniciar um diálogo, sem forçar nada.
Arantangy observa que “Vejo pais forçando uma intimidade que incomoda os filhos. É preciso que os pais falem de si, pois a intimidade é partilhar emoções numa via de mão dupla”. (1995, p. 94)
Entretanto é necessário que haja limites na conversa entre pais e filhos. O respeito deve sempre existir. Pai e mãe não são coleguinhas que trocam figurinhas, mas sim pessoas adultas que devem se mostrar como seres humanos que sentem, erram, acertam como qualquer outro. É isto que os pais devem demonstrar, não precisam necessariamente falar sobre tudo que já passaram, desta forma estarão evitando que sejam apontados como culpados caso os filhos cometam algum erro igual ao do passado dos pais. O adolescente pode pensar: se meu pai fez, eu também posso fazer.
Pais que tiveram uma educação rígida normalmente possuem dificuldade em lidar com este tipo de assunto. Muitos possuem uma sexualidade problemática, mal resolvida e não sabem como ajudar seus filhos. Como diz Marta Suplicy: “A grande maioria dos pais buscam uma receita, uma resposta fácil para baixar sua ansiedade diante da situação que eles estão vivendo" (1983, p. 34).
De um lado podemos encontrar aqueles pais que fingem nada estar acontecendo com receio de enfrentar a situação. De outro estão os superprotetores que querem saber tudo sobre o filho. Os pais devem ter em mente que não existe uma receita pronta. É importante buscar informação de como orientar os filhos, mas uma boa dose de intuição sempre ajuda.
Para falar de sexo com o filho é preciso, antes de tudo, criar um ambiente favorável, onde ele se sinta seguro, tendo liberdade sem correr o risco de ser reprimido.
A hora para estas conversas também deverá ser observada. Não se pode querer conversar num momento de um flagra da filha com o namorado, por exemplo, ambos estarão exaltados demais para trocar idéias. Também não precisa ser algo tão formal como fazer uma reunião com este destino. O ideal é aproveitar uma observação feita pelo filho diante de alguma cena na tv, ou se nada for comentado a mãe/pai/parente poderá perguntar: o que você acha disso?
Os pais devem estar atentos porque muitos adolescentes, com vergonha utilizam um colega como pivô da história falando na verdade de si mesmo, por exemplo: “mãe, fulana me disse que está afim de um garoto que ela acha que também está afim dela, mas ela não sabe como agir, o que ela deve fazer?”. Ao invés de responder prontamente, é interessante que a mãe devolva a pergunta: o que você faria? Ou: o que você acha que ela deveria fazer? Desta forma, você terá oportunidade de saber o que seu filho está sentindo e observar como pensa. Entretanto, se policie para não invadir onde não foi chamada. Não aproveite esta dúvida para perguntar coisas do tipo: “E você, está afim de alguém?” Espere até que ela sinta confiança em você para se abrir. Se isto não acontecer, reveja seus conceitos, atitudes e respostas.
Para o adolescente obter melhores informações sobre o sexo, a melhor opção seria levá-lo a um especialista. Um médico poderá orientá-lo sobre os métodos contraceptivos, riscos de doenças etc. É uma forma mais segura de aprender, pois nem sempre os pais saberão orientar bem nestas questões.
Se o adolescente não se sentir à vontade com a presença dos pais é importante que ele seja respeitado e que entre sozinho no consultório.
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