quinta-feira, 1 de abril de 2010

NEE - ENTENDER PARA INTERVIR

Necessidades educativas especiais - Entender para intervir
Resumo: O objetivo deste sintético artigo é fazer a diferenciação entre os distúrbios e as dificuldades de aprendizagem, mostrando que, frente a uma hipótese diagnóstica, temos condições de melhor prepararmos os educadores, pais e professores e promover o sucesso da criança com necessidades educativas especiais.

Palavras-chave: escola, criança, dificuldades e distúrbios de aprendizagem, aspectos cognitivo, biológico e afetivo-social.


A função primordial da escola situa-se no patamar da relação entre a necessidade de se repassar os significados culturais, que foram sócio e historicamente ampliados, e a dinâmica dessa transmissão, que foi formalmente estabelecida ou institucionalizada. Portanto, é na escola que encontramos a possibilidade desse conhecimento ser socializado, gerando aprendizagem, e é nela também que temos a oportunidade de verificar quando há algum obstáculo nesse processo, os quais denominamos de dificuldades ou distúrbios de aprendizagem. Segundo Ciasca (2003), “... a criança nasce em um mundo com passado, em um grupo social que irá transmitir-lhe seus costumes e sua linguagem, e todo conhecimento deverá ser adquirido fragmento por fragmento, misturado a outras experiências pessoais que se desenvolverão progressivamente...”

Nas Dificuldades ou nos Distúrbios de Aprendizagem — estes últimos (DA) caracterizados como uma disfunção no Sistema Nervoso Central (SNC) —, ocorre uma “falha” no processo de aquisição do conhecimento ou do desenvolvimento (portanto, de caráter funcional); enquanto as Dificuldades Escolares (DE) estão relacionadas especificamente a um problema de ordem ou de origem pedagógica, ou seja, alguma interferência no contexto desse processo, seja na metodologia, na relação professor–aluno ou em quaisquer outras dificuldades socioafetivas; segundo Ciasca (2001). Portanto, nós, educadores, ao nos depararmos com uma criança que aparentemente não consegue aprender, necessitamos entender o que causa essa não-aprendizagem para intervirmos com melhores condições pedagógicas ou encaminharmos essa criança na direção de possíveis soluções, normalmente com a necessidade de ajuda de outros profissionais: psicólogos, fonoaudiólogos, neurologistas, psicopedagogos, etc.

Dessa forma, na escola, podemos encontrar diversos portadores de necessidades educativas especiais ou, ainda, diversas estruturas ou condições que desemboquem neste não-aprender, inclusive patologias que implicam dificuldades na estrutura de personalidade desses aprendizes — como é o caso de crianças psicóticas. Podemos definir em palavras simples que a psicose é uma alteração na estrutura da personalidade mais grave que a neurose. O psicótico necessita de cuidados especiais também na escola. Esses pacientes, chamados, por alguns autores, de atípicos ou emocionalmente perturbados (alguns autores classificam o autismo nessa categoria), possuem transtornos no pensamento e no afeto, daí a necessidade de acompanhamento especializado, pois, na maioria das vezes, não detêm o controle voluntário de suas ações, provocando imprevisíveis explosões de violência e regressões a estados de desamparo e dependência primitiva, necessitando assim de atenção e preparo especializado do profissional que o acompanha.

A criança autista apresenta alterações e déficits na capacidade de relacionamento com as pessoas que a cercam, assim como alteração na capacidade para utilizar a linguagem como meio de comunicação social. Em seu comportamento, observam-se ações que são repetidas várias vezes e sempre da mesma forma (estereotipadas). Essas frágeis crianças necessitam de muita compreensão e afeto dos que as cercam sem, no entanto, apresentar muita resposta a essas atitudes afetivas. Elas normalmente são calmas e solicitam pouca atenção, mas há, no entanto, aquelas que choram incansavelmente, tornando-se difícil consolá-las. Torna-se, portanto, importante, além do acompanhamento e da orientação à sua família, a necessidade de conhecer bem essa criança, observá-la para ter informação valiosa sobre seus hábitos, como utiliza os objetos, seu nível de autonomia e formas de comunicação que facilitarão a interação dela com os colegas e educadores.
Precisamos ver, em primeiro plano, que ali temos uma criança e só, em seguida, uma dificuldade, que, com investimento psicológico e pedagógico, poderá ser superada e/ou minimizada.

No caso das crianças portadoras de deficiências motoras, temos dois tipos ou duas causas mais freqüentes, segundo Bautista (1997): a Espinha Bífida e a Paralisia Cerebral. Em ambos, deve-se cuidar para que nada impossibilite, a essas crianças, a aquisição do conhecimento, lembrando que sua dificuldade maior situa-se no patamar motor, e não no cognitivo. Para tanto, o professor ou a instituição escolar deve tentar eliminar todos os obstáculos ou barreiras materiais ou procedimentais. Contudo, precisamos ter em mente que o mais importante é propiciar um clima favorável para um desenvolvimento afetivo equilibrado que viabilizará a inserção social dessas crianças. A deficiência motora por Espinha Bífida constitui-se numa má formação da coluna vertebral (anomalia congênita), que afeta de forma permanente as suas atividades, porém são crianças normais do ponto de vista de suas funções intelectuais. Na deficiência motora por Paralisia Cerebral acontece uma disfunção motora devido a uma lesão encefálica não-progressiva que pode acontecer antes, durante ou pouco depois do parto. Para os dois tipos, o que pode interferir no processo de aprendizagem é a falta de experiências por condições afetivas e/ou sociais, como, por exemplo, o período de privação social devido às longas internações hospitalares ou a falta de convívio com outras crianças devido à dificuldade de locomoção ou vergonha dos pais.

A criança com síndrome de Down possui uma anomalia cromossômica (3 em vez de 2, no par 21) que é diagnosticável desde o nascimento. Isso favorece a possibilidade de iniciar uma estimulação precoce, desenvolvendo assim suas potencialidades. Hoje, a maioria dos estudiosos nessa área concordam que o principal obstáculo enfrentado por essas crianças situa-se apenas no preconceito social que elas e suas famílias enfrentam. São crianças que, se bem estimuladas (como qualquer outra criança deve ser), terão um desenvolvimento pleno. Observa-se, no entanto, que elas possuem um ritmo próprio nesse desenvolvimento; passam mais tempo em cada estágio, embora de forma semelhante. Na escola, devemos estimular essas crianças para que melhor desenvolvam sua comunicação, sua motricidade e autonomia pessoal, pois, muitas vezes, esta dificuldade é maior devido à superproteção dos pais. Segundo o psicopedagogo francês Feustein, “inteligência se aprende”. Ele possui um programa de desenvolvimento de criatividade e aprendizagem dirigido a essas crianças, que, quando adultas, muitas vezes chegam a mudar, através de uma plástica, as características tão marcantes dos olhos.

Como podemos perceber, diante do que foi exposto, a necessidade de um diagnóstico preciso é imprescindível. O processo de avaliação deve permitir-nos identificar quais são as necessidades educativas do aluno e seu grau de especificidade, como, por exemplo, se há orientação para adaptações curriculares ou meios específicos de acesso ao currículo regular. Então, torna-se evidente que todo esse processo não acontece com a atuação de apenas um profissional (o professor) e, sim, com parceria da família e de todos os que compõem a ação educativa. Sendo assim, temos condições de atingir o objetivo de um desenvolvimento de caráter mais global, envolvendo os aspectos afetivo, social, biológico e principalmente cognitivo desse aluno. Precisamos ver, em primeiro plano, que ali temos uma criança e só, em seguida, uma dificuldade, que, com investimento psicológico e pedagógico, poderá ser superada e/ou minimizada.



Referências Bibliográficas:
BAUTISTA, R. Necessidades educativas especiais. Lisboa, Coleção Saber Mais, 1993.
CIASCA, S. Distúrbios de aprendizagem: proposta de avaliação interdisciplinar. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.
GOLDSTEIN, S. Hiperatividade — como desenvolver a capacidade de atenção na criança. Campinas: Papirus, 2000.
LIPP, M. (org.) Crianças estressadas — causas, sintomas e soluções. Campinas: Papirus, 2003.
PAÍN, S. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 1992.
Sobre a Autora:
Maria Ângela de Mello Cassundé: psicóloga clínica e escolar; mestre em Psicologia Cognitiva pela UFPE; professora do Curso de Psicologia e do Curso de Especialização em Psicopedagogia da Faculdade de Ciências Humanas – Facho; professora da Faculdade Olindense de Ciências Contábeis e Administrativas – Focca.